terça-feira, 6 de outubro de 2015

Martins Fontes - Poesia


O Espírito da Matéria

Também as catedrais são sinfonias:
Rege a massa coral da arquitetura
a divinização da partitura;
e ambas se irmanam por analogias!

O alegro, o adágio, o andante, a tessitura,
o arco, o fuste, o florão... Alegorias
que, pela execução das harmonias,
timbram exatas, no esplendor da altura!

E, pelos olhos, as orquestras se ouvem.
E, pelo ouvido, a torre se levanta,
para que os sonhos da matéria louvem!

E, na sua amplitude sacrossanta,
a alma de um Brunelleschi ou de um Beethoven,
fulge na pedra, quando a pedra canta!
                                                    (A Canção de Ariel)

Fonte bibliográfica: "Martins Fontes - Poesia". Nossos Clássicos. Direção de Alceu Amoroso Lima e Roberto Alvim Correa. Livraria Agir Editora, Rio de Janeiro, 1959. 

domingo, 4 de outubro de 2015

Dados biográficos do escritor Martins Fontes


1884 – 23 de Junho: nasce em Santos, Estado de São Paulo, o poeta José Martins Fontes.

1889 – Faz estudos primários com sua mãe D. Isabel Martins e, depois, com seu pai, Dr. Silvério Fontes, médico, sociólogo, jornalista.

1892 – 1 de Maio: estreia do menino como orador, lendo, no “Centro Socialista”, um hino a Castro Alves.

1898 – Adolescente, tendo frequentado os colégios de Leopoldina Coelho, Eugênio Porchat e Tarquínio Silva, transfere-se para o Ginásio Nogueira da Gama, em Jacareí.

1901 – Concluídos os seus estudos de ginásio, matricula-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Durante os anos de estudante, trabalha na “Gazeta de Notícias”, no “O País”, na revista “Careta” e em outros periódicos.

1906 – Doutorando-se, inicia sua carreira como interno na clínica do Dr. Juliano Moreira, no Hospital de Alienados.

1908 – Toma parte, como médico, na Comissão de Obras do Acre, sob a direção de Bueno de Andrade.

1910 – É designado chefe da Assistência Escolar da Prefeitura carioca, auxiliar de Oswaldo Cruz na profilaxia urbana do Distrito Federal.

1914 – Funda, com Olavo Bilac, uma Agência Americana, para serviço de propaganda dos produtos brasileiros em Paris, Havre, Hamburgo, Nova York, etc.

1915 – Passa a residir, de novo, em Santos.

1917 – Publica seu primeiro livro, “Verão”.

1919 – Casa-se com D. Nicota Neto.

1922 – Aparecimento de “Arlequinada”, uma representação em que ele mesmo toma parte.

1923 – Visita de Vargas Vila ao poeta, em Santos.

1924 – Eleito para a Academia de Ciências de Lisboa.

1926 – Publica “Vulcão” (poemas).

1930 – Acompanha Júlio Prestes em viagem que este, então eleito Presidente da República, fez à Europa e Estados Unidos.

1931 – Publica “A Flauta Encantada”.

1933 – Publica “Sombra, Silêncio e Sonho”.

1937 – (Início do Ano): visita de Vilaespesa. – 25 de Junho: falece Martins Fontes em sua cidade natal, Santos. 

Fonte bibliográfica: "Martins Fontes - Poesia" - Coleção Nossos Clássicos - Direção de Alceu de Amoroso Lima e Roberto Alvim Correa. Livraria Agir Editora, Rio de Janeiro, 1959. 

domingo, 12 de julho de 2015

Poesias de Raul Leôni


Crepuscular

Poente no meu jardim... O olhar profundo
Alongo sobre as árvores vazias,
Essas em cujo espírito infecundo
Soluçam silenciosas agonias.

Assim estéreis, mansas e sombrias,
Sugerem à emoção em que as circundo
Todas as dolorosas utopias
De todos os filósofos do mundo.

Sugerem... Seus destinos são vizinhos:
Ambas, não dando frutos, abrem ninhos
 Ao viandante exânime que as olhe.

Ninhos, onde vencida de fadiga,
A alma ingênua dos pássaros se abriga
E a tristeza dos homens se recolhe.


História antiga

No meu grande otimismo de inocente,
Eu nunca soube por que foi... um dia,
Ela me olhou indiferentemente,
Perguntei-lhe por que era... Não sabia...

Desde então transformou-se de repente
A nossa intimidade correntia
Em saudações de simples cortesia
E a vida foi andando para a frente...

Nunca mais nos falamos... vai distante...
Mas, quando a vejo, há sempre um vago instante
Em que seu mudo olhar no meu repousa,

E eu sinto, sem no entanto compreendê-la,
Que ela tenta dizer-me qualquer cousa,
Mas que é tarde demais para dizê-la...


Artista

Por um destino acima do teu Ser,
Tens que buscar nas cousas inconscientes
Um sentido harmonioso, o alto prazer
Que se esconde entre as formas aparentes.

Sempre o achas, mas ao tê-lo em teu poder
Nem no pões na tua alma, nem no sentes
Na tua vida, e o levas, sem saber,
Ao sonho de outras almas diferentes...

Vives humilde e inda ao morrer ignoras
O Ideal que achaste... (Ingratidão das musas!)
Mas não faz mal, meu bômbix[1] inocente:

Fia na primavera, entre as amoras,
A tua seda de ouro, que nem usas
Mas que faz tanto bem a tanta gente...


[1] Bicho da seda. 

sábado, 11 de julho de 2015

Dados Biográficos do escritor Raul de Leôni


1895 – 30 de Outubro: Nasce, em Petrópolis, Estado do Rio, Raul de Leôni Ramos, filho do magistrado Carolino de Leôni Ramos e de D. Augusta Villaboim Ramos.

1903 – Cursa o Primário e a seguir o Secundário, no Colégio Abílio, na Capital Federal.

1910 – 11 de setembro: Faz a primeira comunhão, aos 15 anos de idade, na Capela do Colégio São Vicente, dos Padres Premonstratenses, em Petrópolis, onde se encontra internado.

1912 – Matricula-se Raul de Leôni na Faculdade Livre de Direito do Distrito Federal, colando grau de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais quatro anos após.

1913 – 9 de abril: Parte Raul de Leôni para a Europa, aos 18 anos, indo visitar a Inglaterra, a França, Itália, Espanha e Portugal.

1914 – De volta do Rio de Janeiro, inicia colaboração literária nas revistas “Fon-Fon” e “Para-Todos”, colaborando mais tarde em “O Jornal” (1919), no “Jornal do Commercio” e no “Jornal do Brasil”.

1918 – 13 de março: É nomeado por Nilo Peçanha, Ministro das Relações Exteriores no governo Wenceslau Brás, para o cargo de 2º secretário da Legação do Brasil em Cuba, não chegando a assumir, regressando da Bahia.

1919 – Após declinar da sua declinação para cargo idêntico, em nossa Legação junto ao Vaticano, é eleito deputado à Assembleia Fluminense.

1919 – Publica o seu primeiro livro de poesias, a “Ode a um poeta morto”, dedicado à memória de Olavo Bilac.

1921 – 6 de abril: Casa-se em Petrópolis, com D. Ruth Soares Gouvêa, que havia conhecido, três meses antes, num baile do Itamarati.

1922 – Publica o seu livro clássico “Luz Mediterrânea” e começa a colaborar no jornal “O Dia”, de Virgílio de Mello Franco e Azevedo Amaral.

1923 – Adoece do pulmão, abandonando o convívio de parentes e amigos e indo para Correias e a seguir, Itaipava, licenciando-se do cargo de inspetor na Companhia de Seguros em que trabalhava.

1926 – 21 de novembro: Morre, na “Vila Serena”, em Itaipava, Raul de Leôni, sendo conduzido o seu corpo, em derradeira viagem, para Petrópolis, que lhe presta as suas últimas homenagens, sepultando-o à sombra do Cruzeiro das Almas, erigindo-lhe um mausoléu e dando o seu nome a um trecho da Rua Sete de Setembro.


Fonte bibliográfica: Raul de Leoni - trechos escolhidos. Por Luiz Santa Cruz. Coleção Nossos Clássicos. Publicados sob a direção de Alceu Amoroso Lima, Roberto Alvim Corrêa e Jorge de Sena. Livraria Agir Editora, Rio de Janeiro, 1961.  

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Ronald de Carvalho – Poesia – Parte 3


Brasil
                                       Ronald de Carvalho

Nesta hora de sol puro
         palmas paradas
         pedras polidas
         claridades
         faíscas
         cintilações

Eu ouço o canto enorme do Brasil!

Eu ouço o tropel dos cavalos de Iguaçu.
      correndo nas pontas das rochas nuas,
      empinando-se no ar molhado, batendo
      com as patas de água na manhã de
      bolhas e pingos verdes;

Eu ouço a tua grave melodia, a tua bárbara
      e grave melodia, Amazonas, a melodia
      da tua onda lenta de óleo espesso, que se
      avoluma e se avoluma, lambe o barro
      das barrancas, morde raízes, puxa ilhas
      e empurra o oceano mole como um touro
      picado de farpas, varas, galhos e
      folhagens;

Eu ouço a terra que estala no ventre quente
      do nordeste, a terra que ferve na planta
      do pé de bronze do cangaceiro, a terra
      que se esboroa e rola em surdas bolas
      pelas estradas de Juazeiro, e quebra-se
      em crostas secas, esturricadas no Crato
      chato;

Eu ouço o chiar das caatingas – trilos, pios,
     pipios, trinos, assobios, zumbidos, bicos
     que picam, bordões que ressoam retesos,
     tímpanos que vibram límpidos, papos
     que estufam, asas que zinem, zinem,
     rezinem, cris-cris, cicios, cismas, cismas
     longas, langues – caatingas debaixo do
     céu!

Eu ouço os arroios que riem, pulando na
      garupa dos dourados gulosos, mexendo
      com os bagres no limo das luras e das
      locas;

Eu ouço as moendas espremendo canas, o
      glu-glu do mel escorrendo nas tachas, o
      tinir das tijelinhas nas seringueiras;
      e machados que disparam caminhos,
      e serras que toram troncos,
      e matilhas de “Corta-Vento”, “Rompe-Ferro”,
             “Faíscas” e “Tubarões acuando
              suçuaranas e maçarocas,
e mangues borbulhando na luz,
e caititus tatalando as  queixadas para os
             jacarés que dormem no tijuco morno dos
             igapós...

Eu ouço todo o Brasil cantando, zumbindo,
            gritando, vociferando!

Redes que se balançam,
sereias que apitam,
usinas que rangem, martelam, arfam,
      estridulam, ululam e roncam,
tubos que explodem,
guindastes que giram,
rodas que batem,
trilhos que trepidam,
rumor de coxilhas e planaltos, campainhas,
        relinchos, aboiados e mugidos,
repiques de sinos, estouros de foguetes,
        Ouro Preto, Bahia, Congonhas, Sabará,
vaias de bolsas empinando número como
           papagaios,
tumulto de ruas que saracoteiam sob arranha-céus,
vozes de todas as raças que a maresia dos
         portos joga no sertão!

Nesta hora de sol puro eu ouço o Brasil!

Todas as tuas conversas, pátria morena, correm pelo ar!
a conversa dos fazendeiros nos cafezais,
a conversa dos mineiros nas galerias de ouro,
a conversa dos operários nos fornos de aço,
a conversa dos garimpeiros, peneirando as bateias,
a conversa dos coronéis nas varandas das roças...

Mas o que eu ouço, antes de tudo, nesta hora,
            De sol puro,
palmas paradas
pedras polidas
claridades
brilhos
faíscas
cintilações  
             
é o canto dos teus berços, Brasil, de todos
           esses teus berços, onde dorme, com
           a boca escorrendo de leite, moreno, confiante,
o homem de amanhã!


Referência bibliográfica: 
Ronald de Carvalho - Poesia e Prosa. Por Peregrino Junior. Coleção Nossos Clássicos, sob direção de Alceu Amoroso Lima e Roberto Alvim Correa. Livraria Agir Editora, Rio de Janeiro, 1960. 

terça-feira, 10 de março de 2015

Ronald de Carvalho – Poesia – parte 2


Cheiro de Terra

Há versos que são como um jardim depois da chuva:
deixam em nós a sensação da água caindo,
caindo em bolhas trêmulas da ponta das folhas,

escorrendo da péla macia das pétalas,
pingando dos galhos lavados, gota a gota,
pingando no ar...

Versos que cheiram a terra molhada,
versos que são como um jardim depois da chuva...


Monotonia da Tarde Tropical

Nos jardins do arrabalde os girassóis dourados
abrem os cálices pesados para o poente.
Nos jardins solitários desce a penumbra suavemente,
desce a penumbra nos jardins calados.

Doçura do crepúsculo,
Doçura das montanhas e das árvores silenciosas
no crepúsculo...

Rola no ar morno um perfume acre de ervas queimadas
um perfume voluptuoso de carne e de frutas ácidas.

Sobre os jardins do arrabalde,
Surge trêmula, trêmula,
a primeira estrela.


Verdade

A verdade é talvez um momento feliz.
O teu momento feliz...  


Fonte bibliográfica: Trechos de "Epigramas irônicos e sentimentais" (1922) em "Ronald de Carvalho - Poesia e Prosa" por Peregrino Júnior. Coleção Nossos Clássicos, sob a direção de Alceu Amoroso Lima e Roberto Alvim Correa. Livraria Agir Editora, Rio de Janeiro, 1960.  

domingo, 1 de março de 2015

Ronald de Carvalho – Poesia


Interior

Poeta dos trópicos, tua sala de jantar
é simples e modesta como um tranquilo pomar;

no aquário transparente, cheio de água limosa,
nadam peixes vermelhos, dourados e cor de rosa;

entra pelas verdes venezianas uma poeira luminosa,
uma poeira de sol, trêmula e silenciosa,

uma poeira de luz que aumenta a solidão.

Abre a tua janela de par em par. Lá fora, sob o céu de verão,

Todas as árvores estão cantando! Cada folha
é um pássaro, cada folha é uma cigarra, cada folha é um som...

O ar das chácaras cheira a capim melado,
a ervas pisadas, a baunilha, a mato quente e abafado.

Poeta dos trópicos,
dá-me no teu copo de vidro colorido um gole d’água.
(Como é linda a paisagem no cristal de um copo d’água!)  


Fonte bibliográfica:

"Interior" (de "Epigramas Irônicos e Sentimentais" - 1922) em "Ronald de Carvalho - Poesia e Prosa", por Peregrino Júnior, da Coleção Nossos Clássicos, sob a direção de Alceu Amoroso Lima e Roberto Alvim Correa. Livraria Agir Editora, Rio de Janeiro, 1960.