segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Sobre o artigo “Grave Crise Existencial” de João Ubaldo Ribeiro


Foi publicado no jornal “O Estado de São Paulo”, em 11 de Novembro de 2012, o artigo intitulado “Grave Crise Existencial” de autoria de João Ubaldo Ribeiro.

Nesse artigo, João Ubaldo Ribeiro faz uma crítica irônica da situação de direitos autorais dos escritores que estão cada vez mais desvalorizados.

O autor inicia fazendo considerações irônicas sobre as variadas origens e os nomes diversos dados ao peru, como pavo, turkey, puter, galinha de Calicute, dindon, galo da Índia... Desse modo, atenta para o “problema de identidade” da ave.
A seguir, J.U. Ribeiro desculpa-se por esse preâmbulo, mas é a forma que ele encontra para introduzir a respeito da situação de escritores e artistas em que ele se vê cada vez mais envolvido. Assim, compara a situação de quem vive de direitos autorais à situação do peru. Ou, como diz, “pior, porque outro dia, não me lembro mais onde, li que já morremos todos”. Reforça então que, conforme alguém disse por aí, “o autor morreu”. Dessa forma, ele não se sente nem mesmo em condições de ser dono desse próprio artigo que está escrevendo/publicando.
Ele tenta se soerguer “na tumba”, mas o “sagrado direito à informação” o sepulta de novo, pois, se o que ele escreve é informação, e ele cobra por isso, está “cerceando esse direito”.
Ora, então ele dá a entender que não é por ser sagrado o direito de comer que o dono do supermercado vai ficar sem pagamento...
Bem, assim também é o direito à saúde e, no entanto, seus profissionais também são remunerados.
Assim, o autor diz que o artista deveria ser então quase que um monge com uma “generosidade intelectual” para a livre fruição de todos.
A essa altura ele então acrescenta que: “Porque a maioria dos escritores encara com relutância a ideia de santificação inanida, somente aqueles que têm fontes de renda poderão escrever. Quanto aos outros, que consigam empregos com os poderosos, que cavem uma sinecurazinha, que ganhem dinheiro nas bolsas de valores e escrevam nos momentos de lazer, mas não desçam à infâmia de cobrar pelo que escrevem”.
A seguir ele lembra que aventa-se a possibilidade de o Estado resolver essa questão. Faria a regulamentação da profissão... Após aprovação em concurso o escritor portaria a “carteira de escritor”, podendo exercer a profissão. Depois seria criado o “Conselho Editorial Nacional”, ao qual os escritores apresentariam seus projetos, “rápido e sem pistolões ou propinas, como é regra no Brasil”. E o Conselho estabeleceria temas de “interesse” do país como “Saga do Pré-Sal”, ou “Mistério da Transposição de Águas do São Francisco”.
Assinala Ribeiro que o autor receberia um “módico estipêndio mensal”, pois trata-se de dinheiro público, além de prestar contas e fazer modificações conforme as determinações de tal “Conselho”.
Assim, continua: “todos vão ter direitos sobre o que o autor escrever, menos ele próprio, até porque já morreu”.
J.U. Ribeiro conclui que “ninguém estranha quando uma BBB ganha um ou dois milhões para mostrar o traseiro e ministrar-nos palestras filosóficas”.
Arremata então que, no entanto, se um escritor, depois de muitos anos de trabalho, ganha um prêmio de cem mil (reais, dólares, o que seja...) há grande perplexidade...
Finaliza então que, na próxima encarnação, vai tentar vir como “Mulher Fruta-Pão”.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Guilherme de Almeida e Paul Verlaine


Entre os poetas franceses traduzidos por Guilherme de Almeida está o poeta simbolista Paul Verlaine (1844-1896). Segue abaixo uma de suas traduções, ou como ele preferia, uma "reprodução",  ou "recriação", ou "transcrição", ou "transfusão".

Canção de Outono

Estes lamentos
Dos violões lentos
     Do outono
Enchem minha alma
De uma onda calma
     De sono.

E soluçando,
Pálido, quando
     Soa a hora,
Recordo todos
Os dias doidos
     De outrora.

E vou à toa
No ar mau que voa:
      Que importa?
Vou pela vida,
Folha caída
       E morta.

Chanson d’automne

Les sanglots longs
Des violons
      De l’automne
Blessent mon coeur
D’une langueur
     Monotone.

Tout suffocant
Et blême, quand
    Sonne l’heure,
Je me souviens
Des jours anciens
    Et je pleure.

Et je m’en vais
Au vent mauvais
      Qui m’emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
      Feuille morte.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Guilherme de Almeida – Poeta e Tradutor


Em uma edição (5ª) da Editora Babel do livro de Guilherme de Almeida intitulado “Poetas de França”, no prefácio, Marcelo Tápia, estudioso de sua obra, assinala que o autor propôs um “encontro” entre a poesia de língua francesa e a de língua portuguesa, com as suas traduções de originais franceses. Dessa forma, considera Guilherme que não se trata exatamente de simples tradução, mas antes de criar uma nova poesia a partir da original. Assim, ainda conforma Tápia, Guilherme rejeita o termo “traduzir” para poesia e prefere “reproduzir” e introduz os termos “recriação”, “transcrição” e “transfusão” para essa forma de tradução.
Dessa obra apresentamos aqui a tradução de Guilherme de Almeida para um original de Edmond Haraucourt:

Rondó do Adeus

Partir é morrer um pouco
Para tudo o que se adora:
Por toda parte, a toda hora,
Deixa-se a alma pouco a pouco.

É o luto de um sonho, um oco
Na vida, um verso que chora:
Partir é morrer um pouco!

E parte-se, e é um jogo, e a troco
De nada, até a última hora,
É a alma que se joga fora
A cada adeus como um louco:
Partir é morrer um pouco...

Rondel de l’adieu

Partir, c’est mourir um peu,
C’est mourir à ce qu’on aime:
On laisse um peu de soi-même
Em toute heure et dans tout lieu.

C’est toujours le deuil d’un voeu,
Le dernier vers d’un poème:
Partir, c’est mourir un peu!

Et l’on part, et c’est un jeu,
Et jusqu’à l’adieu supreme,
C’est son âme que l’on sème,
Que l’on sème a chaque adieu:
Partir, c’est mourir um peu...