segunda-feira, 23 de julho de 2012

Memórias da Memória - Zikaron - Parte 3

Embora Zikaron tenha sido escrito em primeira pessoa, não é uma autobiografia. A ideia da personagem principal foi embasada em relatos recolhidos de jornais a respeito de indivíduos que, tendo crescido ou vivido em orfanatos ou instituições públicas, foram capazes de superar várias dificuldades até conseguirem concluir curso universitário e terem boas condições de  viver e trabalhar com criatividade e cidadania. A formação de tal individualidade e identidade se faz com singulares condições de memória que se entrecortam na narrativa.
O cenário dessa narrativa foi escolhido de modo a preservar uma memória: a memória quase perdida de uma cidade grande como São Paulo. Muitas vezes decantada como "a cidade que mais cresce no mundo", ou ainda como "São Paulo não pode parar", essa metrópole tem como sua maior fragilidade a "sua memória". Esse movimento, essa velocidade e esse crescimento varrem tudo à sua frente pelo processo em si de crescer em volume, em tamanho, mas talvez não em sua alma.
Quando imaginei o cenário de Zikaron, aí certamente recorri a minha própria memória do bairro do Tatuapé. Mas poderiam ser outros tantos bairros que divisassem condições semelhantes, como, aliás, tem sido referido pessoalmente a mim por leitores do livro. Em geral, quem viveu em cenário semelhante sente logo uma identificação com a narrativa. Entra aí a "memória de lugar", "memória do espaço", "memória da cidade", "memória da comunidade".
Como foi informado hoje em artigo do jornal "O Estado de São Paulo" em uma notícia sobre a construção de edifícios na Moóca, os moradores desse bairro temem que a Moóca perca "sua alma".
Que percepção e que imagem forte e significativa!!
Eles estão percebendo que correm esse risco: o bairro pode perder sua alma!
Se isso acontecer, o que será da Moóca? Será que deixará de ser Moóca?
Para onde irá tudo que lá foi vivido e construído? Como evitar que se perca essa memória?
O que acontece hoje na Moóca fez também parte de Zikaron.
Em relação a São Paulo, a necessidade de Zikaron é agora!
1977 pode ter marcado um dos últimos anos em que ainda se podia ver, respirar, perceber fortemente essa alma dos bairros de São Paulo: todo um mundo peculiar em risco de ser esquecido!
A memória de um indivíduo entrecruza-se com a memória de um lugar.
Até quando São Paulo será capaz de manter sua memória? 

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